quarta-feira, 10 de abril de 2019

Sobre descascar paredes e encontrar rebocos... Carla Pepe

"Não é o amor que sustenta o relacionamento. É o modo de se relacionar, que sustenta o amor."
Bruno Mars
Um dia desses achei cartões de amor na gaveta. Eu sempre amei cartões, cartas. Os poetas tem dessas coisas. E eles me fizeram lembrar do amor que vivi. Amor de juventude, pueril, ingênuo, de declarações, de tantas intenções. Amor que, hoje, é lembrança e prova de que realmente existiu.

Há uns dois anos tomei uma das decisões mais dolorosas da minha vida: me separar. Partir de uma relação com alguém que eu conhecia desde os meus 13 anos. Eu sabia quem ele era, no mais íntimo das doídas verdades. E ele sabia quem eu era. Deixar um lugar tão aconchegante, mas que por razões que a vida explica, ficou solitário, foi um dos saltos mais difíceis que dei. Por muito tempo, sabia quem eu era daquele jeitinho, naqueles limites, naquela redoma. Pegar meus trapos emocionais e partir foi um ato de sobrevivência, mas também um tiro no escuro.

Aos que dizem “mais fácil é se separar, dificil é ficar casado.” Vocês não sabem de nada inocentes. Desconhecem o processo de rever cartões de amor, de ver a cama vazia, de olhar sua história de amor terminada. Alguns dizem “não deu certo, tenta uma próxima vez”. 28 anos de relacionamento: considero um sucesso estrondoso. Quem fica em cartaz 28 anos e ainda tem produto? Tenho um fruto valioso desse amor: Giulia.  Eu amei profundamente. Mas como diz o poeta: “que seja infinito enquanto dure”. E a essa relação, que foi infinita enquanto durou, rendi toda minha gratidão.

Saltei. Pulei. Me estabaquei. Porque agora era eu comigo mesma na forma mais primitiva. Não havia mais alguém com quem contar de forma íntima. O dito sexo seguro não tem a ver com camisinha, tem a ver com intimidade, com descoberta, com experiências. Ser feliz parecia um pecado original. Mas houveram ganhos: encontrei colos onde chorar, desci a raba para dançar, andei a procura de um lugar. Também fiz uma irmandade: as mulheres - rainha de seguir o baile.

Solteira, sozinha, na minha solitude, que ás vezes, é solidão mesmo, me recomponho. Me refaço, me desfaço, na confusão me perco e  me acho. Ainda tenho o que desejo fazer, as experiências que anseio viver, as músicas que vou escutar de olhos fechados para melhor sentir. No dia de hoje, só sei que nada sei. Cometerei erros, como já cometi tantos. Quero amar a tantos, como minha intensidade permite. Quero provar sem pranto o gosto da minha essência, descoberta em reboco na minha alma.

E, depois disso tudo, erguer nova casa, pintar paredes, encher com móveis a nova-velha alma, essência fresca vista em espelho. E quem sabe, um dia, novamente, dividir espaços com um novo amor.

Carla Pepe